Editor, tradutor, bibliotecário e ensaísta, foi dirigente de organizações trotskistas estadunidenses e destacado estudioso da obra de Marx – tendo desenvolvido o conceito de “socialismo a partir de baixo” Por Felipe Cotrim * DRAPER, Hal; Harold Dubinsky (estadunidense; Nova Iorque, 1914 – Berkeley/ Estados Unidos, 1990). 1 – Vida e práxis política Filho de imigrantes de etnia ucraniana, oriundos do Império Russo, Harold Dubinsky, mais tarde conhecido como Hal Draper, nasceu e cresceu no distrito nova-iorquino do Brooklyn, tendo cursado o ensino médio na escola masculina Boys High School. Seu pai, Samuel Dubinsky, era gerente em uma fábrica de camisas. Sua mãe, Annie Kornblatt Dubinsky, mantinha uma loja de doces, meio pelo qual sustentou a família após a morte do marido, quando Hal tinha apenas dez anos. Hal Draper foi o irmão mais novo de Theodore Draper (1912-2006), que se tornaria historiador do movimento comunista estadunidense; seus outros irmãos foram Dorothy Rabkin e Robert Draper. A adoção do sobrenome “Draper”, sonoramente anglo-saxônico, foi ideia de sua mãe, visando proteger os filhos do preconceito, uma vez que “Dubinsky” denotava uma origem europeia oriental. Em 1934, graduou-se no Brooklyn College. Envolvido em política desde a adolescência, neste mesmo ano se tornou membro da Young People’s Socialist League [Liga Socialista da Juventude Popular] (YPSL) – a juventude do Socialist Party of America [Partido Socialista da América] (SPA) –, passando a militar contra o fascismo, as guerras e o desemprego, e se aproximando do trotskismo. Ainda jovem, Hal Draper se casou com Anne Kracik Draper (1917-1973), marxista e sindicalista envolvida nas lutas pela emancipação das mulheres. Juntos, militaram durante décadas em organizações trotskistas. Vivendo em Nova Iorque, durante a década de 1930 ele também atuou como editor-assistente do jornal trotskista Socialist Appeal [Chamado Socialista], lecionou em escolas de ensino médio da cidade e, pela YPSL, participou das insurreições estudantis – ocorridas no contexto da Grande Depressão (1929-1939). Em 1937, sendo uma das principais lideranças da YPSL, Draper criticou a “stalinização” da Internacional Comunista – a III Internacional (1919-1943) – e, após a entrada de militantes trotskistas no SPA, votou a favor da formação da IV Internacional (1938). Com esta decisão, apoiada pela maioria do partido, os demais membros ou saíram ou foram expulsos. Em 1938, Hal Draper rompeu com o SPA, ingressando então no Socialist Workers Party [Partido Socialista dos Trabalhadores] (SWP) – partido do qual foi secretário-nacional de Juventude, membro da primeira Executiva Nacional e secretário do National Education Department [Departamento Nacional de Educação]. Pouco mais tarde, Draper foi contra a ruptura no SWP (1940), cisão motivada pela chamada “questão russa”, ou “soviética” (a polêmica em torno do apoio incondicional ou oposição crítica à União Soviética), e pela concepção burocrática e hierárquica de partido defendida por James Cannon (então líder do SWP). Neste mesmo ano, Hal Draper saiu do SWP e ajudou a fundar o Worker’s Party [Partido dos Trabalhadores] (WP) – que seria dirigido por Max Shachtman. Este partido – que não apoiava a União Soviética, por considerá-la uma sociedade “burocrático-coletivista” – defendia um modelo socialista que se pretendia mais “democrático”, o que foi sintetizado no lema: “Nem Washington, nem Moscou, mas por um terceiro campo do socialismo independente!” – origem da corrente Third Camp Socialism [Terceiro Campo do Socialismo]. Em oposição à concepção de partido de James Cannon, o WP tentou desenvolver uma cultura interna menos hierárquica, com espaço a debates internos e sem repressão às dissidências. Em 1942, Hal Draper, depois de organizar seções políticas do WP no Leste de Massachusetts e na Filadélfia (entre 1941 e 1942), mudou-se para Los Angeles, onde também organizaria seções do partido. Aí, juntamente com sua esposa, trabalhou no distrito de San Pedro, como operário em estaleiros navais, e militou em campanhas antifascistas e antirracistas. Depois da II Guerra (1939-1945), ele retornou para Nova Iorque, onde passou a editar o The New International [A Nova Internacional], revista marxista primeiramente dirigida pelo SWP (entre 1934 e 1940) e, depois, pelo WP (entre 1940 e 1958). Em 1949, enfraquecido, o WP optou por deixar seu estatuto de “partido”, sendo rebatizado de Independent Socialist League [Liga Socialista Independente] (ISL). Durante os anos 1950, Draper assumiu também o cargo de editor do jornal da organização – o Labor Action [Ação Trabalhista] – até o racha de 1958, quando uma de suas alas, da qual ele era oposição, migrou para o SPA, desarticulando a ISL. No ano de 1958, Hal Draper teve problemas de saúde, os quais exigiam que ele vivesse em um local com clima mais ameno. Depois de viajar pela Europa com sua compenheira Anne, mudou-se para Oakland, Califórnia. Em 1960, o casal se fixou na vizinha Berkeley. Nesta cidade, Hal regressou à academia, obtendo seu mestrado em Biblioteconomia, pela University of California (UC), instituição onde também trabalhou como bibliotecário. Em 1961, ele fundou e foi membro do Conselho Editorial do New Politics [Nova Política], periódico sediado em Nova Iorque e ligado ao movimento do Terceiro Campo do Socialismo. Ainda este ano, escreveu uma obra de ficção científica: “Ms Fnd in a lbry: or, the day civilization collapsed” [“Sra. Fnd em uma bbltc: ou o dia em que a civilização colapsou”] (The Magazine of Fantasy and Science Fiction, 1961) – conto no qual satiriza a “era da informação”. Por este tempo, junto com o socialista Joel Geier, organizou também os Independent Socialist Clubs [Clubes Socialistas Independentes] (ISC), dedicados à preservação da tradição revolucionária terceiro-campista; estes clubes serviriam de base política para muitos militantes socialistas estadunidenses nas décadas de 1960, 1970 e 1980. Durante os anos 1960, Hal Draper foi um dos mentores do Free Speech Movement [Movimento pela Liberdade de Expressão] (1964-1965), de Berkeley; do California Peace and Freedom Party [Partido Californiano da Paz e Liberdade] (PFP-California); do movimento de oposição à Guerra do Vietnã (1955-1975); e de outras organizações de esquerda precursoras da New Left [Nova Esquerda] (movimento político que se dedicou a novas reivindicações por direitos civis e políticos), nos Estados Unidos. Essa sua colaboração com o Free Speech Movement de Berkeley merece atençãoContinuar lendo “O marxismo de Hal Draper”